O governo Lula, ao admitir que pode reduzir tarifas de importação de alimentos como uma medida para conter a inflação no setor, reconhece um fato inescapável: barreiras comerciais encarecem os produtos no mercado interno. O pragmatismo da medida expõe uma realidade evidente para economistas há décadas: o Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo, e essa condição restringe a oferta, limita a concorrência e penaliza o consumidor. Não há solução mágica para a inflação.
Como apontou Samuel Pessôa aqui na Folha, fatores como a desvalorização cambial de 2023, que atingiu 27%, e a necessidade de ajuste fiscal pesam na dinâmica inflacionária. O mercado de trabalho aquecido também pressiona os preços, especialmente no setor de serviços, cuja inflação subjacente atingiu 8,80% nos três meses terminados em janeiro de 2025. Apesar disso, a política comercial tem impacto direto sobre os preços, e não há justificativa para manter barreiras que elevam custos e limitam a oferta.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) reagiu à proposta do governo com objeções previsíveis. Parte do setor alega que a medida é apressada, que não há desabastecimento e que os preços seguem padrões globais. Contudo, ignoram que, ao proteger artificialmente a produção local, criam ineficiências e impedem a população de acessar produtos mais baratos no mercado internacional. O protecionismo apenas transfere os custos para os consumidores e reduz a competitividade da economia brasileira.
No setor industrial, os críticos costumam afirmar que a abertura comercial prejudica a produção nacional. No entanto, a história econômica contradiz essa visão. De acordo com um levantamento realizado por Gregory Mankiw, professor de Harvard e autor de best-sellers acadêmicos, revelou que 93% dos economistas concordam que “tarifas e cotas de importação geralmente reduzem o bem-estar econômico geral”. Mesmo economistas internacionalmente conhecidos por posições mais à esquerda, como Paul Krugman, defendem que o Brasil teria ganhos significativos com uma maior integração ao comércio global.
Folha Mercado
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Fora do Brasil, tem-se discutido que tarifas propostas por Donald Trump podem elevar significativamente os preços nos Estados Unidos, afetando desde eletrônicos e automóveis até alimentos e vestuário. Além do impacto inflacionário direto, essas tarifas podem desencadear retaliações comerciais, prejudicando exportações e setores como agricultura e indústria automobilística.
Com a alta nos custos de importação, o Federal Reserve pode ser forçado a aumentar as taxas de juros, encarecendo o crédito e reduzindo o poder de compra dos consumidores. Ainda que algumas indústrias possam ganhar competitividade interna no curto prazo, setores dependentes de importações, como varejo e tecnologia, podem enfrentar cortes de empregos. Além disso, Scott Lincicome do Cato Institute destaca que as políticas comerciais recentes dos EUA, tanto sob Trump quanto sob Biden, foram menos sobre comércio e mais sobre política doméstica e eleitoral.
Enquanto Trump usou tarifas como moeda de troca para acordos comerciais, Biden manteve e expandiu barreiras tarifárias sem buscar novas negociações de livre comércio. O resultado foi um isolamento comercial que enfraqueceu a competitividade americana, enquanto o restante do mundo continuou a fechar acordos comerciais, beneficiando empresas e consumidores estrangeiros.
No longo prazo, a abertura comercial favorece a eficiência econômica, a competitividade e a integração do Brasil no mercado global. Não se trata de aumentar importações apenas, mas de criar condições para que o país expanda suas exportações e participe mais ativamente das cadeias globais de valor.
Se o governo reconhece que tarifas elevadas prejudicam o acesso a alimentos mais baratos, por que não estender esse raciocínio para toda a economia? Reduzir barreiras comerciais é uma escolha estratégica para garantir um Brasil mais competitivo, inovador e acessível para quem não pode passar férias em Miami.
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noticia por : UOL