20 de abril de 2025 - 0:10

Mudar a Ficha Limpa para ajudar Bolsonaro é multiplamente inconstitucional

Um projeto de lei complementar talhado para beneficiar um indivíduo — Bolsonaro — é pornograficamente inconstitucional. Se Motta, presidente da Câmara, quer piscar para a aberração porque, no universo das ideias puras, considera que oito anos de inelegibilidade constitui tempo demais — volto ao tema —, não pode dar um de sonso, fingindo ignorar que a proposta tem endereço.

§9º DO ARTIGO 14 DA CONSTITUIÇÃO
Até aqui, lidei com valores da Constituição. Prestem atenção, no entanto, ao que vem agora. A mudança pretendida na Lei da Inelegibilidade afronta também a literalidade da Constituição. Vamos ver? A Constituição define no Artigo 14 as razões de inelegibilidade. E remete, como está no Parágrafo 9º, para lei complementar, outras causas de inelegibilidade. Transcrevo a passagem:
“9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”

Está claro para você, leitor? Proteger a eleição dos abusos de poder não é questão de gosto, mas mandamento constitucional. Inexiste a opção de não fazer. Caso se altere, como quer Bibo, o Inciso XIV do Artigo 22 da Lei da Inelegibilidade, quem for condenado por abuso de poder econômico, abuso de poder político e abuso no uso dos meios de comunicação — justamente as três imputações que resultaram em duas condenações de Bolsonaro no TSE, reitero — ficará inelegível por apenas dois anos, tomando como referência para a contagem de tempo o ano a eleição.

Ora, é uma forma de ignorar o que dispõe a Constituição. Para tais crimes, ter-se-ia a mais desbragada e arreganhada impunidade. E o mandamento constitucional estaria sendo jogado no lixo. Ou alguém acha que dois anos servirão para conter os apetites vorazes? Ao contrário: eles serão açulados. Ainda mais explicitamente: na contramão do que dispõe a Carta, não se protegerão “a probidade, a moralidade e a legitimidade”; far-se-á precisamente o contrário. Aliás: o objetivo do projeto de Bibo Nunes é precisamente tornar inócuas e a Lei Eleitoral e a Constituição.

QUAIS OUTROS CRIMES?
O presidente da Câmara parece ter a impressão, ou algo assim, de que oito anos de inelegibilidade é tempo excessivo. Não deixa claro se está se referindo a qualquer crime ou apenas àqueles três contemplados no projeto de Bibo. Lembra Motta que isso compreende quatro eleições. E daí? Houvesse coincidência entre eleições federais/estaduais e municipais, seriam apenas duas. Mistura o que é contingente com o princípio.

Muito tempo por quê? Os oito anos de inelegibilidade para aqueles crimes toma como medida a Lei Complementar 81, de 1994 (a da Ficha Limpa é de 2010), que aplica essa punição para parlamentares das Três esferas de Poder cassados por quebra de decoro ou por infringir proibições expressas no Artigo 54 da Constituição.

noticia por : UOL

20 de abril de 2025 - 0:10

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