23 de fevereiro de 2025 - 19:02

Fungo sequestra corpo de aranhas e as transforma em zumbis

Um galpão abandonado de armazenamento de pólvora se destaca em uma reserva natural na Irlanda do Norte. É o lugar perfeito para uma aranha: semissubterrâneo, fresco e escuro. Mas em 2021 uma equipe que fazia um programa de natureza da BBC encontrou mais do que uma aranha comum se escondendo lá. Eles avistaram uma aranha morta com seu corpo tomado por um fungo branco.

O fungo, segundo artigo publicado no mês passado no periódico Fungal Systematics and Evolution, é uma espécie recém-descoberta que se espalha pelo corpo da vítima, transformando-a em um zumbi. Essa estratégia evolutiva ficou conhecida pelo fungo da formiga zumbi Ophiocordyceps, que inspirou o videogame e a série “The Last of Us”, da HBO.

Voluntários de um centro localizado perto da cidade de Belfast ajudavam os cineastas da BBC quando notaram a aranha infectada. Fotos da vítima chegaram até Harry Evans, um membro emérito da CAB International, organização sem fins lucrativos voltada à pesquisa agrícola e ambiental. “Eu imaginei que fosse uma espécie desconhecida ou incomum e solicitei o espécime assim que as filmagens terminaram”, disse Evans, um dos autores do artigo.

Quando o programa da BBC foi ao ar, o explorador de cavernas Tim Fogg entrou em contato com Evans para dizer que observou um fungo semelhante em cavernas irlandesas. Cada 1 das 5 aranhas infectadas que Fogg coletou estava envolta por um pequeno emaranhado de fungos.

João Araújo, autor do artigo e curador de micologia no Museu de História Natural da Dinamarca, disse que ele e seus colegas acreditam que, quando um esporo pousa em uma aranha, o fungo brota uma estrutura semelhante a uma raiz chamada tubo germinativo que perfura o exoesqueleto do aracnídeo. Uma vez dentro da vítima, o fungo se multiplica, “basicamente assumindo quase todo o corpo da aranha”.

Como as do santuário de Belfast, as aranhas observadas por Fogg haviam se deslocado para uma área externa, perto das entradas das cavernas, antes de morrer. Essa posição ajuda a agenda parasitária do fungo: capturar correntes de ar para espalhar seus esporos da maneira mais eficiente possível, segundo Araújo.

Evans propôs nomear o fungo de Gibellula attenboroughii, em homenagem ao naturalista e apresentador David Attenborough. Attenborough desempenhou um papel importante no sucesso da Unidade de História Natural dos Estúdios da BBC e, assim, indiretamente ajudou a levar à descoberta da nova espécie de fungo.

A ecologista molecular Charissa de Bekker, da Universidade de Utrecht, nos Países Baixos, disse que foi inspirada a estudar fungos zumbis pela série “Planeta Terra”, de Attenborough, e que nomear essa espécie em homenagem a ele foi um grande tributo, especialmente porque revelou algo importante sobre aracnídeos e o mundo em que habitam.

“As aranhas são criaturas muito incompreendidas”, disse Bekker, que não estava envolvida no estudo. “Elas são tanto predadoras quanto presas, então são elementos-chave nas cadeias alimentares. Compreender quais parasitas elas contraem e quais infecções elas têm pode nos dar uma melhor compreensão desses ecossistemas.”

Para Araújo, é importante aprender “quem são esses fungos, quais insetos e artrópodes eles infectam, como eles evoluem, de onde vêm.” Segundo ele, os fungos zumbis poderiam ajudar a controlar pragas agrícolas —uma substância química produzida por um parente de Ophiocordyceps já é usada em medicamentos para prevenir a rejeição de órgãos em pacientes transplantados.

“Esses são os químicos da natureza e a única fonte de novos antibióticos e outros medicamentos para o futuro”, disse Evans. “Devemos encontrar maneiras de identificá-los antes que mais ecossistemas naturais desapareçam junto com os fungos.”

noticia por : UOL

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