27 de abril de 2025 - 8:07

Francisco reformou Igreja, mas de forma cautelosa; entenda o que mudou na doutrina

Apesar da reputação de revolucionário, o papa Francisco foi bastante cauteloso ao propor novos desenvolvimentos da doutrina católica, mesmo quando estimulava debates sobre temas espinhosos. A maioria das mudanças que implementou foi de natureza pastoral, ou seja, na relação cotidiana dos sacerdotes com os fiéis e na ênfase dada pela Igreja Católica a determinados temas. No entanto, algumas alterações de fato ocorreram, com destaque para as visões do catolicismo acerca do casamento e da pena de morte. Entenda a seguir

Possibilidade de comunhão para divorciados em segunda união

O pontífice argentino promoveu uma abertura cuidadosa sobre o tema na exortação apostólica “Amoris laetitia” (“A alegria do amor”), datada de 19 de março de 2016. Nesse documento, Francisco aborda, entre outros temas, a situação dos católicos que vivem uma união conjugal classificada como irregular. Um dos casos desse tipo envolveria casais em que um ou ambos os cônjuges já tinham tido um casamento religioso católico anteriormente e, com o fim desse casamento, tinham encontrado um novo parceiro.

COMO ERA

A Igreja considera, de modo geral, que essas uniões não deveriam acontecer e correspondem a um pecado grave. Mas Francisco argumentou que a situação concreta de cada casal é mais complicada e não se encaixa numa lógica binária.

COMO FICOU

“É possível que uma pessoa, no meio de uma situação objetiva de pecado –mas que subjetivamente não seja culpável ou não o seja plenamente–, possa viver em graça de Deus, possa amar e possa também crescer na vida de graça e de caridade, recebendo para isso a ajuda da Igreja”, escreveu o papa.

Numa nota de rodapé, ele acrescentou: “Em certos casos, poderia haver também a ajuda dos sacramentos”, citando a Eucaristia, ou seja, a comunhão. Após a publicação do texto, em diálogo com as conferências de bispos da Argentina, da Alemanha e de outros lugares, ele aprovou um modelo “caso a caso” no qual casais formados por divorciados poderiam receber o acesso à Eucaristia após um período de reflexão e análise ao lado do sacerdote de sua paróquia. No caso brasileiro, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) produziu um documento que deixou a possibilidade em aberto, em “casos limitados”, mas sem estabelecer critérios muito específicos.

Bispos de outros locais, como os EUA, por exemplo, adotaram uma interpretação mais rigorosa da doutrina e não oficializaram essa possibilidade.

Bênçãos para casais heterossexuais “irregulares” e casais homossexuais

A última grande controvérsia doutrinal do papado de Francisco veio com a declaração “Fiducia supplicans” (“Confiança suplicante”), publicada em 18 de dezembro de 2023. Assinada pelo cardeal argentino Víctor Manuel Fernández, atual prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé e um dos colaboradores mais próximos do pontífice, a declaração aborda bênçãos dadas pelos sacerdotes católicos a casais “em situação irregular”, tanto heterossexuais quanto homossexuais.

COMO ERA

Tal como no caso da “Amoris laetitia”, a Igreja evitava permitir bênçãos desse tipo considerando a definição oficial do casamento católico: a união entre um homem e uma mulher diante de um sacerdote para toda a vida.

COMO FICOU

“No horizonte aqui delineado, coloca-se a possibilidade de bênçãos para casais em situações irregulares e casais do mesmo sexo, cuja forma não deve ter nenhuma fixação ritual por parte das autoridades eclesiásticas, para não produzir confusão com a bênção própria do sacramento do matrimônio”, afirma o texto.

A finalidade da bênção é ajudar aqueles que, “reconhecendo-se desamparados e necessitados da ajuda de Deus, não pretendem legitimar seu próprio status, mas rogam para que tudo o que há de verdadeiro, bom e humanamente válido em suas vidas e relações seja investido, santificado e elevado pela presença do Espírito Santo”. “Deus não se afasta nunca de quem se aproxima dele”, acrescenta a declaração. Considera-se, então, que a bênção não é para a união “irregular” em si, mas para as pessoas que participam dela.

Por se tratar, portanto, de uma bênção informal, dada de forma espontânea pelo padre a pedido do casal, é difícil verificar se tem sido adotada ou não de forma ampla no dia a dia das igrejas.

Pena de morte

Francisco também determinou uma mudança significativa nos ensinamentos oficiais do catolicismo sobre a pena de morte. A alteração foi oficializada por ele em 1º de agosto de 2018, com uma nova redação do item 2267 do Catecismo, principal compêndio da doutrina católica.

COMO ERA

Antes, esse trecho do Catecismo aprovava a pena capital em certos casos. “O ensino tradicional da Igreja não exclui, depois de comprovadas cabalmente a identidade e a responsabilidade do culpado, o recurso à pena de morte, se essa for a única via praticável para defender eficazmente a vida humana contra o agressor injusto”, dizia o texto.

COMO FICOU

Já a nova versão afirma: “Hoje, é sempre mais viva a consciência de que a dignidade da pessoa não se perde nem mesmo depois que ela cometeu crimes gravíssimos. Portanto, a Igreja ensina, à luz do Evangelho, que ‘a pena de morte é inadmissível porque atenta contra a inviolabilidade e dignidade da pessoa’, e se dedica com determinação a aboli-la em todo o mundo.” A citação entre aspas dentro desse trecho é de um discurso do próprio Francisco.

noticia por : UOL

27 de abril de 2025 - 8:07

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