O que o cantor Gusttavo Lima, o ministro do STF Kássio Nunes Marques, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) e o humorista Whindersson Nunes têm em comum?
Todos são amigos do peito de Fernando Oliveira Lima, que entrou na mira da CPI das Bets por promover o “jogo do Tigrinho” na internet.
A amizade do senador, em especial, está sob os holofotes depois que a revista Piauí revelou que Fernando Oliveira Lima levou o parlamentar até Mônaco em seu avião particular para assistir ao GP de Fórmula 1 no principado europeu.
Ciro Nogueira é um integrante da CPI das Bets, que tem Fernando — que se apresenta como “Fernanding OIG” — entre os investigados. O empresário é suspeito de usar de artifícios para convencer os incautos a apostar em jogos cujo índice de retorno é nebuloso.
A viagem se deu em um jato Gulfstream G650ER, que vale o equivalente a R$ 400 milhões. E ele não foi a única autoridade da República a usar os favores do empresário.
Empresário vem de família pobre
Fernando Oliveira Lima, de 34 anos, tem um número significativo de seguidores no Instagram — 1,1 milhão — mas pouco num universo em que os mega-famosos acumulam dezenas de milhões. Seus contatos, porém, são poderosos.
“Eu sou uma pessoa de poucas amizades. E para eu ter uma amizade com uma pessoa, eu tenho que ver que essa pessoa realmente merece a amizade”, disse ele em 2021, em uma rara entrevista.
Na época, ao podcast ielcast, Fernando disse ser “um cara que nasceu numa família muito humilde, num bairro muito humilde.”
Natural de Dom Pedro (MA), ele viveu por cerca de dois anos em uma localidade chamada Salina até que sua família se mudou para Teresina (PI). Depois de morar de favor com uma avó, Fernando, os pais e o irmão dele se mudaram para uma casa simples no bairro Parque Rodoviário. O pai era vendedor ambulante e a mãe, dona de casa.
O primeiro emprego de Fernando, aos 14 anos, foi como estoquista em uma loja. Mais ou menos na mesma época, ele começou a se interessar por computadores e percebeu que tinha habilidade com informática. Começou a trabalhar com um servidor que modificava o jogo eletrônico Ragnarok Online e lucrava vendendo itens digitais que podiam ser usados no jogo.
Fernando largou a escola no primeiro ano do ensino médio. “Nesse tempo aí eu já ganhava mais que os professores”, justificou ele, na entrevista. Com 17 anos, ele já ganhava cerca de R$ 10 mil por mês.
Ao podcast, Fernando disse que usou cocaína uma vez, mas que ficou “travada na garganta” e foi para o hospital. Por causa do trauma, ele nunca mais usou a droga. Preferia a “cana”. “Eu saía de segunda a segunda”, contou ele. Por volta de 2010, por causa dos gastos excessivos, os rendimentos como desenvolvedor de jogos desandaram.
Em 2013, a família de Fernando viveu uma tragédia. Criminosos abriram fogo contra o carro do irmão dele. A mãe, que também estava no veículo, levou um tiro na nuca. Ela nunca se recuperou das sequelas e morreu em 2016. Os autores e a motivação do crime continuam desconhecidos.
O salto de rico para milionário veio por volta de 2015, quando Fernando começou a produzir quizzes e jogos para o Facebook. A rede social de Mark Zuckerberg havia acabado de abrir a possibilidade para que desenvolvedores independentes publicassem seus produtos na plataforma. Mais ou menos ao mesmo tempo, Fernando passou a criar sites que ofereciam jogos semelhantes. Neste caso, o lucro vinha do adsense (receita com anúncios) do Google.
O primeiro milhão de reais na conta apareceu quando Fernando tinha 25 anos de idade.
Astuto e já posicionado no mercado, ele não perdeu tempo quando o Congresso aprovou a lei que regulamentou os sites de apostas no país: registrou sua empresa e passou a operar também nesse ramo. Hoje, ele é dono de três casas de apostas: a 7games, a R7 e a Betão. As páginas permitem apostar tanto em eventos esportivos quanto jogos de tiro curto, similares ao Jogo do Tigrinho.
Kássio Nunes Marques também pegou carona
O jato de Fernando Oliveira Lima também carregou uma autoridade do Judiciário.
No ano passado, o ministro do STF Kássio Nunes Marques viajou em um avião do empresário para participar de um compromisso imperdível: o aniversário do cantor Gusttavo Lima, em um iate na Grécia.
“O Kassio é um amigo meu de mais de dez anos atrás lá do Piauí, de comer panelada, buchada de bode e galinha caipira”, disse Fernando Oliveira Lima à CPI das Bets, em novembro do ano passado.
A lista de amigos também inclui o cantor Wesley Safadão e o humorista Tirulipa.
Durante o depoimento no Senado, Fernando reconheceu que sua empresa hospeda o Jogo do Tigrinho no Brasil. “O Fortune Tiger, o famoso Tigrinho, é um jogo desenvolvido pela PG Soft, no qual a gente tem um agregador de serviços, onde a gente paga o serviço, e ele disponibiliza esses jogos aí na nossa plataforma”, ele afirmou. Oficialmente, a empresa responsável pelo jogo tem sede em Malta.
O Grupo OIG, que tem Fernando como CEO, é uma holding que controla seis empresas. Hoje, a companhia tem cerca de 100 funcionários e fatura R$ 200 milhões por ano — segundo disse o empresário à CPI. Além de sites de apostas, o grupo investe no desenvolvimento de jogos para diversas plataformas. Mas, no depoimento à CPI, Fernando não explicou em detalhes o que cada empresa do Grupo OIG faz. O Coaf, órgão do Ministério da Fazenda, identificou operações suspeitas entre a companhia e possíveis laranjas.
Diante dos parlamentares, Fernando defendeu o “Jogo do Tigrinho” que ele definiu como “verdadeiro”. O empresário afirmou que há milhares de jogos similares, não regulamentados, em operação. “O problema todo da fama do Tigrinho no Brasil, desse reboliço todo (…) é do jogo pirata, do jogo falso”, disse.
Ciro Nogueira defendeu empresário em CPI
Na mesma sessão, quando a CPI discutia a possibilidade de uma nova convocação de Fernando, Ciro Nogueira se interpôs e defendeu o “Dr. Fernando”. Deu-se, então, o seguinte diálogo entre ele e a relatora da CPI, Soraya Thronicke (Podemos-MS).
Soraya Thronicke: “Que ele seja intimado pessoalmente para uma data qualquer, daqui 15 dias, 20 dias, porque a gente não consegue intimá-lo. Não sei por que o senhor é tão difícil, é mais fácil encontrar o Papa.”
Ciro Nogueira: Senadora, não é verdade. O Dr. Fernando…
Soraya Thronicke: O senhor está dizendo que eu estou mentindo?
Ciro Nogueira: Não, estou dizendo que não é verdade que é difícil encontrá-lo.
Soraya Thronicke: É muito difícil. Pra mim é. Pro senhor deve ser fácil.
O senador Ciro Nogueira ainda não se pronunciou sobre a carona no jatinho de Fernando Oliveira Lima.
noticia por : Gazeta do Povo